SENADO - Entrada das teles no mercado de TV a cabo gera polêmica

Debate, no auditório do Interlegis, reuniu cinco comissões do Senado e, por videoconferência, Assembleias Legislativas de vários Estados.


[Foto]

A audiência que o Senado realizou nesta quinta-feira (16) sobre o PLC 116/10 reproduziu a polêmica que vem acompanhando o assunto. Além de contrapor os segmentos de telecomunicações, que pretende explorar o serviço de TV a cabo, e o de radiodifusão - que inclui as emissoras de televisão -, a proposta estabelece cotas para a produção nacional de audiovisual.

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) apoia o projeto, com o argumento de que a abertura do mercado às teles pode ampliar a oferta do serviço, melhorar sua qualidade e reduzir os preços cobrados. A agência reguladora, aliás, já vem promovendo a abertura do mercado de TVs por assinatura - iniciativa que foi criticada por vários participantes da audiência, como o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE). Ele argumenta que as medidas adotadas pela Anatel se sobrepõem às discussões sobre o PLC 116/10. Eunício é o relator da matéria na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado (CCJ), da qual é presidente.

O projeto também é defendido pela Agência Nacional de Cinema (Ancine). Além de reiterar "a escassez de oferta e os altos preços do serviço", o diretor-presidente dessa agência, Manoel Rangel, declarou que, "sem esse marco regulatório, não haverá segurança jurídica para o setor".

O PLC 116/10 unifica a legislação para todas as formas de TV por assinatura - além do cabo, a transmissão também pode ser feita via satélite ou microondas. Atualmente, operadoras de telefonia como Telefônica, Embratel e Oi não podem participar da TV a cabo, mas oferecem o serviço via satélite.

Entre os senadores que apoiam a proposta estão Eduardo Braga (PMDB-AM) e Walter Pinheiro (PT-BA). Para Eduardo Braga, que é presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado (CCT), um dos "subprodutos" do novo marco regulatório seria a ampliação da oferta da internet de banda larga no país, com a possível redução nos preços cobrados.

Durante a audiência, o representante das Organizações Globo, Evandro Guimarães, defendeu a aprovação do PLC 116/10 sem qualquer alteração, em particular no que se refere aos artigos 5º e 6º - que impedem as teles de produzir conteúdo. Evandro argumentou que isso é necessário, inclusive, para a identidade cultural do país. 

Grupos dominantes 

Mas nem o setor de radiodifusão apresenta uma posição unificada. O presidente do Grupo Bandeirantes de Comunicação, João Carlos Saad, posicionou-se frontalmente contra o projeto. "O texto não impede que grupos econômicos dominem os diversos pacotes de programas e, assim, mantém o chamado gatekeeper", disse Saad, referindo-se à Globosat, que detém quase 90% da produção. Ele também disse não ser contra a entrada das teles, mas argumenta que a proposta promove uma entrada "desordenada" dessas empresas no mercado de TV a cabo.

Outra crítica à proposta foi quanto à complexidade do texto. Representante da Associação Brasileira dos Programadores de TV por Assinatura, Marcos Bitelli declarou que o texto "usa os truques jurídicos das referências cruzadas [em termos de legislação] e é muito difícil de entender, resultando num quebra-cabeça que só o presidente da Ancine é capaz de explicar".

- Isso vai criar um cipoal jurídico. Se passar no Congresso, não passa no Supremo Tribunal Federal - advertiu Bitelli.

Já a representante do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, Berenice Mendes, protestou por não ter participado da mesa de debates. Ela disse que a sociedade civil não vem sendo ouvida sobre a questão - e que a audiência desta quinta-feira "só deu voz a empresários e agências".

Cotas

As cotas para a produção audiovisual nacional - previstas no PLC 116/10 - foram outro ponto de discordância. O presidente da Ancine, Manoel Rangel, argumentou que a medida é necessária para proteger o conteúdo produzido no país - e que "tal convicção é central para o governo". Mas, para Marcos Bitelli, as cotas revelam "um nacionalismo que não mais se aplica". Segundo Bitelli, "isso representa uma política de restrição, e não de incentivo". Já Luciana Ferri, representante da empresa Home Box Office (HBO), também criticou as cotas. Ela afirmou que a HBO vem produzindo filmes e séries nacionais premiados - como Mandrake, Filhos do Carnaval e Alice - e que as cotas podem prejudicar as parcerias responsáveis por essas obras.

O professor de comunicação da Universidade de Brasília (UnB), Murilo Ramos, observou que essas cotas "geram uma grande reação das programadoras internacionais, sendo uma das razões que tornou a tramitação desse projeto difícil".

Também participaram, por meio de videoconferência, representantes de diversas assembleias legislativas do país.

Ricardo Koiti Koshimizu / Agência Senado