Falta de planejamento, de investimento e burocracia são os entraves da infraestrutura no Brasil, dizem especialistas

Painel no ILB reuniu políticos, estudiosos e representantes de entidades da iniciativa privada
Falta de planejamento, de investimento e burocracia são os entraves da infraestrutura no Brasil, dizem especialistas

Senadores Wellington Fagundes e Ana Amélia na abertura do Painel ILB

 

O senador Wellington Fagundes (PR-MT) afirmou que o Brasil está aquém de seu potencial de produção em função de problemas de logística que criam entraves e provocam bilhões em prejuízos econômicos e financeiros ao país. Ele abriu, nesta quarta-feira, o Painel “Infraestrutura de Transporte e Logística: desafios e perspectivas”, promovido pelo Instituto Legislativo Brasileiro (ILB), do Senado Federal.

Wellington Fagundes comentou o resultado de um relatório apresentado no final de 2015 pela Comissão Senado do Futuro, da qual é presidente, que mostrou problemas de planejamento, continuidade e ausência de marcos legais e regulatórios para o setor.  Segundo ele, um plano de logística de transporte no Brasil deveria ser um projeto de Estado e não de governos. O senador citou um exemplo: uma carga que saia de Sinop, no seu Estado, Mato Grosso, para a China, leva mais de dois mil quilômetros e 36 dias para chegar, o que demonstra o impacto nos custos de transporte e os prejuízos na economia.  

A senadora Ana Amélia (PP-RS), presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado, reforçou a tese do senador ao afirmar que um dos maiores problemas do setor é planejamento inadequado e irresponsabilidade no gasto do dinheiro público. Citou casos recentes de repercussão internacional como a queda da ciclovia recém construída no Rio de Janeiro como um exemplo de comportamento criminoso que coloca o Brasil na condição de país “não sério”. Reforçando o raciocínio de Fagundes, ela lembrou que a saca de milho, necessário para alimentar as aves e os suínos produzidos em Santa Catarina, custam em Mato Grosso 22 reais, mas chegam no destino a 53 reais, devido ao transporte, encarecendo o produto final.

 

Visão setorial

 

Para a economista Priscila Santiago, da Confederação Nacional de Transportes (CNT), os três principais problemas do setor podem ser resumidos em: falta de investimento, falta de planejamento e excesso de burocracia. Ela analisou a Medida Provisória 727, que trata do setor, e não prevê a participação da iniciativa privada, embora, na sua opinião, traga uma “boa sinalização” com relação a algumas regras.

Segundo Priscila, é fundamental que haja planejamento em todas as fases das obras – “obra parada também é custo”, lembrou – e que, em isso, não há investimento, nem segurança jurídica, outra coisa fundamental para alavancar o setor. Ela também cobrou a necessidade de existência de mecanismos de avaliação e acompanhamento das obras em todas as suas fases, na execução física e orçamentária.

A representante da CNT mostrou pesquisas da entidade que mostram a dramática situação do Brasil, como no transporte rodoviário: de 1,72 milhão de quilômetros de estradas, apenas 12% são asfaltados; dos 100 mil quilômetros avaliados no ano passado, 57,3% estão com defeitos significativos, o que representa um aumento de 25% nos custos do transporte.

Como sugestões, Priscila Santiago disse que o setor recomenta: incentivar o investimento privado (mas com o apoio e o direcionamento do governo); garantir a qualidade do investimento público e renovar a frota. Ela também analisou alguns números do transporte ferroviário e aquaviário, que têm menor impacto na economia hoje, mas que poderiam ser mais bem aproveitados. “No fim, temos que são R$ 88 bilhões jogados fora em transporte e logística no Brasil, pois não retornam para ninguém”.

Cenário não mais animador foi o que mostrou Maurício Lima, professor, pesquisador e sócio-diretor do ILOS (Instituto de Logística e Supply Chain). Se o diagnóstico de todos é muito semelhante, se as opiniões são parecidas, perguntou, por que o problema persiste? Ele considera que o momento de crise pode ser importante para haver uma programação para o futuro de médio prazo.

Em comparação com países dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) ou com outros da mesma dimensão territorial, como Estados Unidos e Canadá, a situação do Brasil é sempre péssima, conforme mostrou, com números, Maurício Lima. Segundo dados do Banco Mundial, o Brasil está na 65ª posição em desempenho logístico e na 54ª com relação à infraestrutura.

 

Debates

 

Ao responder a uma pergunta do diretor executivo do ILB, Helder Rebouças, sobre a agenda legislativa das instituições, Priscila Santiago disse que é do interesse da CNT, entre outras, participar do debate no Congresso, pois acredita que o Legislativo pode ajudar muito, inclusive forçando a obrigatoriedade de projetos executivos na contratação de obras do governo, de análise de impacto econômico e do custo-benefício. Já Maurício Lima lamentou que nos eventos internacionais promovidos pelo ILOS não haja representantes nem do Executivo nem do Legislativo brasileiro.

Paulo Viegas, diretor-adjunto do ILB, quis saber a opinião dos palestrantes sobre a necessidade de ajustes nos incentivos governamentais. Para a representante da CNT, a iniciativa privada é extremamente dependente dos incentivos do BNEDS e isto precisaria mudar.

 

Pauta do Congresso

No período da tarde, a consultora do Senado, Liliane Galvão, e o consultor Tarcísio Gomes de Freitas, da Câmara dos Deputados, ambos atuando na área de Transportes, apresentaram painel sobre a pauta do Congresso Nacional.

Liliane falou sobre a PEC 57, já na Comissão de Constituição e Justiça, que prevê o fortalecimento das agências reguladoras e o PLS 52, de 2013, aprovado no Senado e em análise na Câmara, que permitirá que cada agência se torne um órgão orçamentário, resolvendo um impasse atual de contingenciamento desses órgãos, ao estabelecer que as agências terão autonomia para fiscalizar. Esse instrumento poderá dirimir situações como a que foi levantada por um estudo do TCU de 2013 demonstrando que de um total de contratações analisadas, o índice de inexecução chegou a 83%. Citou também a PEC 39, que regulamenta temas ligados à concessões e permissões, podendo ser uma resposta à atual em análise de mais de 50 solicitações de isenção de pedágio em todo o país.

Por fim, mencionou a Medida Provisória 727, recém editada pelo governo interino, que cria o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) para a celebração de contrato de estruturação integrada. Segundo a consultora, ela ainda trouxe novas indagações ao, por exemplo, fazer menção a um Fundo de Apoio à Estruturação de Parcerias sem dar explicações sobre sua criação.

Já o consultor Tarcísio de Freitas, ao falar da recente perda de grau de investimento do Brasil explanou sobre o que chamou de “círculo vicioso da crise” que perpassa pela instabilidade política e regulatória; o baixo investimento interno e externo; a pobreza e o conflito social e o crescimento econômico baixo ou negativo.

Para Tarcísio, o que gera impacto na economia é o investimento em infraestrutura, mas, para isso é necessário resolver problemas relativos à segurança para os investimentos. Um desses gargalos, observou, é a inexistência de uma lei única que trate do meio ambiente com mecanismos para a gestão de risco ambiental.  Tarcísio também defendeu a importância da PL 2261/2015 que prevê a contratação integrada cuja responsabilização fica mais clara e dá espaço para que a iniciativa privada atue no ambiente público.

 

Riscos jurídicos e econômico-financeiros

 

As questões mais técnicas relacionadas ao tema ficaram para a última parte do Painel, com a presença de representantes do Banco do Brasil, do Bando Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do instituto Brasileiro de Estudos da Infraestrutura (IBEJI). Fabiano Macanhan Fortes, gerente geral da Unidade Serviços em Infraestrutura do BB, abordou os custos dos projetos no setor e como eles poderiam ficar até 30% menores se fossem adotados modais de transporte mais eficientes.

Ele mencionou estudos que vem sendo feitos desde 2003 que mostram a necessidade de investimentos da ordem de R$ 200 bilhões em logística no Brasil, o que, reconheceu, é difícil em momentos de ajuste fiscal. Daí a necessidade de parceria com a iniciativa privada. Para isso, no entanto, já que são projetos de longo prazo, é preciso um ambiente de previsibilidade. De qualquer maneira, registrou, “é saudável que a sociedade debata este tema”.

Cleverson Aroeira da Silva, do BNDES, também abordou as dificuldades e os riscos dos projetos de infraestrutura, mas lembrou que em alguns países da América do Sul, como o Chile e a Colômbia, eles têm tido êxito e que o Brasil também precisa se habilitar para receber os investimentos estrangeiros. “E esta tem que ser uma preocupação permanente, numa visão de longo prazo”, afirmou. Em seguida, apresentou questões técnicas relativas a estrutura de financiamento e concessões e fontes de recursos, entre outros.

Os aspectos jurídicos foram abordados por Christian Fernandes Gomes da Rosa, do IBEJI e sócio do TFS Advogados Associados. Ele lembrou que a Constituição brasileira cria uma reserva de mercado para o Estado em infraestrutura porque ela é fundamental para a execução de políticas públicas. E infraestrutura, acrescentou, é também saúde e saneamento básico, que são áreas estratégicas, que o Estado deve organizar, mas pode delegar a execução para agentes privados.

No entanto, segundo Christian Fernandes, como os investimentos são muito elevados e tanto os prazos como a remuneração são longos, surgem muitas incertezas. E esta é a área em que o Direito é chamado a intermediar. Mesmo porque, no Brasil, são inúmeros os agentes com quem os investidores, nacionais ou estrangeiros, terão que lidar, incluindo Ministério Público, Tribunais de Contas e Agências reguladoras. O quadro, portanto, é de difícil ação.